AZATHOTH (1922)

Tradução de Ricardo Madeira

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Quando a idade se abateu sobre o mundo, e a maravilha abandonou as mentes dos homens; quando cidades cinzentas ergueram na direcção de céus enfumarados altas torres austeras e feias, na sombra das quais ninguém pode sonhar com o sol ou com os prados florescentes da Primavera; quando vendo a Terra despida do seu manto de beleza, os poetas não mais cantavam excepto sobre fantasmas retorcidos vistos com olhos remelosos e que olhavam para dentro; quando estas coisas eram acontecidas, e as esperanças infantis para sempre se tinham ido, houve um homem que viajou para fora da vida numa busca ao interior dos espaços para onde os sonhos do mundo haviam fugido.

Do nome e residência deste homem apenas pouco ficou escrito, pois pertenciam só ao mundo despertado; contudo diz-se que ambos eram obscuros. Basta saber que o homem habitava uma cidade de paredes altas onde o estéril crepúsculo reinava, e que ele labutava todo o dia entre a sombra e o tumulto, regressando à noite a casa para um quarto cuja única janela se abria não para campos e arvoredos mas para um pátio escuro que outras janelas fitavam em baço desespero. Daquele caixilho apenas se podiam ver paredes e janelas, excepto quando às vezes uma pessoa se inclinava bastante para fora e perscrutava no alto as pequenas estrelas que passavam. E porque meras paredes e janelas não demoram a conduzir à loucura um homem que sonha e lê muito, o morador naquele quarto costumava noite após noite inclinar-se para fora e perscrutar as alturas para vislumbrar algum fragmento de coisas para além do mundo desperto e do cinzento das cidades altas. Anos depois ele começara a chamar as lentas estrelas navegantes pelos nomes, e a segui-las na sua mente quando elas pesarosamente deslizavam para fora do alcance da vista; até que por fim a sua visão acabou por se abrir a muitas vistas secretas de cuja existência nenhum olho comum suspeitara. E uma noite um abismo poderoso foi atravessado, e os céus assombrados por sonhos dilataram-se para baixo até à janela do solitário observador para se fundirem com o ar viciado do quarto e fazer do homem uma parte da sua fabulosa maravilha.

Chegaram àquele quarto selvagens fluxos de meia-noite violeta que brilhavam com pó de ouro; vórtices de pó e fogo, rodopiando para fora dos últimos espaços e pesados com os perfumes de além-mundos. Oceanos opiáceos verteram-se lá, iluminados por sóis que o olho nunca poderá contemplar e tendo nos seus remoinhos de água estranhos golfinhos e ninfas-do-mar de profundidades irrecordáveis. O infinito silencioso girou em torno do sonhador e carregou-o dali sem sequer tocar o corpo que se inclinava com rigidez da solitária janela; e durante dias não tomados em conta pelos calendários dos homens as marés de esferas distantes transportaram-no com gentileza para o juntarem aos sonhos pelos quais ansiava; os sonhos que os homens perderam. E no decurso de muitos ciclos as marés deixavam-no ternamente a dormir numa costa de verde amanhecer, uma verde costa fragrante com flores-de-lótus e adornada por cúmulos vermelhos...



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